No começo, somos apenas uma existência singular na
descoberta do mundo, literalmente, caindo e levantando, engatinhando e
aprendendo a andar, e descobrindo, em
pormenores, uma história fantástica: A vida.
Extrapolando o lúdico, as fantasias, e saboreando-os na sua
textura delicada, a criança cresce apreendendo tudo a sua volta. Registrando
fatos, fotografando-os na mente curiosa, como flashbacks, montando um quebra-cabeça que vai se encaixando com
facilidade, no limite das descobertas: formas, cores, dimensões, construindo a
própria história, única, em fragmentos elaborando sua trajetória na vida.
Através do contato tão particular entre o mundo imaginário e
o real, ela vai expressando as preferências e, pelo tato, paladar, olfato,
visão e audição, vai estabelecendo uma conexão de informações, imergindo na
percepção, detendo a soberania do seu mundinho.
À medida que constrói suas verdades, também fabrica medos,
liberta-se na imaginação e cria seus fantasmas, adota como mimos pedrinhas,
flores, chupetas, e travesseiros, e transforma objetos obsoletos em talismãs.
Agarra-se neles para fugir do temido “bicho-papão” ou, o “velho do saco”.
A criança vai criando uma simbologia, e adotando uma postura
de respeito, adoração ou medo para com eles. Zomba, ri, muitas vezes, mas corre
de medo do desconhecido. A beleza reverenciada na infância é a pureza da alma,
ainda não contaminada com as chagas do caráter.
Na infância somos protagonistas de nossas próprias
histórias: de princesas, dragões, cavaleiros e fadas. Isso faz com que tenhamos
capacidade para elaborar dentro do processo de desenvolvimento biopsicossocial,
a própria identidade, continuando a ser protagonistas na realidade, com o
livre-arbítrio para fazer escolhas e enfrentar os bichos-papões que,
porventura, apareçam.(...)
Texto extraído do livro Nós Desfeitos de nós: Desafios.